terça-feira, 30 de julho de 2013

Vamus nus

Comecei a fechar as portas abertas em Itacaré ha duas semanas. No Sham Rock Blues, um lugar onde foi ótimo estar e trabalhar, avisei antecipadamente sobre minha ida. Um Pub em Itacaré, onde eu ouvia rock todas as noites, todas as três nas quais eu trabalhava semanalmente. Lá tinha muita conversa, eu servia, sorria, bebia, cantava e dançava enquanto trabalhava. Meu chefe era um argentino muito louco, Max, e Iane era a dona, que eu só encontrava na praia. Foi uma delicia passar por lá, mas como nem tudo é perfeito, no Sham o esquema  é "Divirta-se muito e ganhe pouco". E o pouco já estava muito pouco Pra viver.
Me despedi dos amigos, arrumei minhas coisas em uma mochila emprestada. Mochila do Caue, de 35 litros, para TODAS as minhas coisas. É claro que não coube nem metade. Ainda bem, por que não daria conta de carregar.
Na véspera da partida consegui despachar minha mala de rodinhas para São Paulo, através da Aline, uma querida, amigona da Marília, que estava em Itacaré de ferias, hospedada na Buddy's. Uma fofa, mas completamente louca.
Mandei algumas coisas de volta dentro da mala, metade eu deixei na Buddy's, e o estritamente necessário, e algumas coisitas, eu soquei na mochila e vim.
Eu, Yanina e Nelson, o casal de chilenos, levamos cinco dias para chegar em Vila de São Jorge, Chapada dos Veadeiros, GO.
O mais difícil foi conseguir sair de Itacaré e chegar na cidade vizinha. Andamos muito, mas depois os bons ventos soprara nosso favorece deu tudo muito, muito certo.
O caminho foi percorrido com a ajuda de um ônibus escolar, que mos levou através da estrada para Taboquinhas. Estrada de terra, ônibus cheio de estudantes da zona rural da região. Naquele ônibus que chacoalhava loucamente, em um calor do meio dia, conheci Raiane, super esperta, aluna da sétima serie. Comunicatiiiiiva, ela nos explicou tudo sobre a região, ate onde ia o ônibus, como era a estrada, como era sua vida, falou sobre os pais, sobre a fazenda onde moravam e trabalhavam. Falou sobre a vontade de ir mais vezes a praia, pois apesar de estar a pouquíssimos km de Itacaré os pais nunca tem condições de passear. Ficou super curiosa e fez mil perguntas sobre a gente, a viagem e sobre São Paulo, me disse sem muita certeza que um dia quer ir Pra São Paulo, estudar direito. Eu olhei aquele ônibus, velho, com buracos no chão e muita ferrugem. Aquele monte de criança e adolescente, cheio de curiosidade olhando Pra gente, a Raiane, e me deu um apertinho no coração. Quantas daqueles crianças vão concluir os estudos? quantas vão terminar o ano letivo? Quantas vão conseguir realizar seus sonhos? Quantas vão conseguir sonhar?  Cada parada do ônibus era na entrada de uma fazenda e desciam cinco, as vezes mais de dez crianças em cada fazenda. Nos descemos no ponto final, uma Vilinha de frente Pra estradinha de terra. Ali ja tinha uma kombi aguardando os alunos que desceram do ônibus, entre eles Raiane, que ainda segue mais meia hora de kombi, Pra só então atravessar o rio de barco e andar ate sua casa. Que Deus e todo o universo renovem as força e a vontade de Raiane sonhar e realizar. 
Depois que a Kombi se foi e o ônibus escolar foi estacionado acabou o movimento da Vilinha. E só restamos nós no ponto de onibus, em uma estradinha de terra onde não passava ninguém, até que passou Allan, na estrada enlameada e esburacada parou de bom grado e nos deu carona, não só carona, ele nos convidou para conhecer sua fazenda turística, Vila Rosa, jantar e dormir por lá. Será que nos aceitamos?
No dia seguinte saímos logo cedo e de carona chegamos em Ubaitava, onde na BR 101 conhecemos o LuLa, um caminhoneiro muito figura, falante e feliz. Ns disse que gostava de dar carona Pro "nosso pessoal", os últimos haviam sido um casal de holandeses, que ele fez questão que depois fossem visita-lo em sua casa e nos intimou a fazer o mesmo. Passamos algumas horas no caminhão com Lula, chegando próximo a Cruz das Almas ele nos disse que já estava ficando triste, por que estávamos chegando no ponto de descer e ele seguiria viagem sozinho. Ele nos contou muitas historias e muitos causos, nos deu dicas, mas principalmente falou com muito orgulho das três filhas super inteligentes, diversas vezes, principalmente da filha doutora, primeiro lugar em medicina em três universidades federais, "ela pode escolher", dizia ele, e hoje depois de mestrado e doutorado, ("ela é doutora meeeesmo, de doutorado e tudo"), na Suíça e em Cuba, ela é o orgulho da familia.e. Ainda tem a dentista e a aspirante a advogada. O homem era só orgulho, mas demonstrava muito mais orgulho em dizer que todas eram tão loucas quanto ele, e que adoravam uma farra, simplicidade e cerveja. Me fez ligar Pra minha mãe, do seu celular, quando disse que ela era muito preocupada.
Lula me passou seu endereço, em Juazeiro do Norte. Quer nos ver lá a qualquer custo, e durante a viagem se empolgava falando dos lugares onde vai nos levar Pra conhecer. No caminho fizemos uma parada obrigatória Pra provar o melhor suco de laranja do mundo, em uma barraquinha na beira da estrada. E realmente estava muito ótimo. Ele nos deixou o posto de caminhoneiros, em Feira de Santana. Nos abraçou calorosamente, nos fez mil recomendações e se foi, rumo a Juazeiro.
Foi virar as costas e demos de cara com Gilmar, perguntamos Pra onde ia, e ele disse Brasília. Malandro, esse foi o momento em que eu quis chorar de emoção. Foi a primeira pessoa que eu vi, a primeira que indaguei sobre carona e o cara vai exatamente Pra onde nos vamos. Como faz Brasil? A gente desconfia, claro, por que a vida nunca é assim tão fácil. Então eu agradeci, ele disse que só ia na manha seguinte, e eu passei as três horas seguintes caçando carona pelo posto com Yanina e Nelson, Pra sair ainda naquela noite.
Dentro da lanchonete Nelson conheceu Jorge, enquanto eu estava arrumando uma carona ate Barreiras, metade do caminho. No fim das contas não seguimos Pra Barreiras, por que fomos fazer o jantar na cozinha móvel do caminhão do Jorge. Ele nos convidou por que tinha feito muito feijão, e nao queria que estragasse, levamos nosso arroz Pra cozinhar lá. Dai apareceu um com uma bacia de batatas, que havia ganhado e não podia comer por que era diabético. Chegou outro com uma peca gigante de queijo de Minas e resumindo, fizemos um jantarzão no estacionamento do posto, entre duas carretas, com música e muitas risada. E adivinha quem estava lá com a gente. Gilmar, todo prosa e só conversa e sorriso. Os caminhoneiros descolaram uns tickets Pra banho nos banheiros do posto, que me surpreenderam. Parecia um vestiário de clube, enquanto eu esperava um lugar desmantelado, mal iluminado, sujo e com água fria. Foi uma surpresa muito, muito feliz.
Depois desta convivência gastronômica não havia mais como desconfiar da boa vontade e da boa sorte que nos apresentou ao Gilmar. Seguimos com ele.
E assim passaram os dias, aprendi um bocado sobre a vida dos caminhoneiros e lembrei muito do meu pai, em varias situações. Ele que também é caminhoneiro, e passa pelas mesmas alegrias, apuros, solidão e saudade de casa, unanimidade entre todos, mas apesar de tudo nenhum quer trocar de vida. Alguns, próximos da aposentadoria, estão contando os dias, mas só Pra descansar. Como o Lula, que não se vê trabalhando em outra coisa, só quer mais tempo Pra farriar com as filhas.
Esse post e essa parte do caminho vão pro meu pai, vivência minha é claro, mas tudo a ver com ele, conosco, em lembrança e sentimento.
Vai Pra ele que deve estar em alguma estrada entre Minas e Paraná. Ouvindo moda de viola ou música sertaneja. Estressado com o transito, policia rodoviária, buracos na estrada ou rindo alto, fazendo piada com alguém pelo radio ou falando bagarai e tomando breja enquanto espera o dia seguinte Pra sair com o caminhão carregado. 
Ele não vai ler, não é um adepto da internet.
Deve estar tentando me ligar ha dias, e puto, por que  aqui não tem sinal. Kkk!

Te amo madruga!

sexta-feira, 12 de julho de 2013

Parte II

Chegado em Salvador estávamos todos fora do nosso território, todos sendo guiados por uma francesa em Salvador. A única que conhecia o caminho.
Saindo da Rodoviária e atravessando uma ponte sobre um rio poluído, cercado por rodovias em suas margens  me trouxe uma certa familiaridade com o local.
Pegamos o ônibus e seguindo a orientação do cobrador, descemos no lugar errado, e andamos, muito, na chuva.
Com uma super mochila nas costas eu andava pela orla da Barra e pensava de quanto tempo vou precisar para começar a deixar minhas coisas pelo caminho, cansada de carregar os exageros que carrego comigo. Talvez ainda tenha que andar muito, e aposentar a mala de rodinhas.
Depois do que me pareceram milhas e milhas finalmente encontramos o prédio.
Novo drama.
Marion toca o interfone. O porteiro atende, ela informa o apartamento em questão. O porteiro então estica o pescoço para ver melhor os cinco mendigos molhados, com mochilas, perdidos no bairro de classe media as onze da noite.
Desconfiado o porteiro reponde que não havia entendido. Marion repetiu o número do apartamento e o nome da Vó. Tive que entrar na conversa, por que nao estava rolando um entendimento. Ele nos disse que a dona não estava, explicamos a situação e que na verdade era o neto dela que nos esperava. O porteiro afirmou categoricamente que Caio também não estava, que não aparecia lá havia semanas, e que o apartamento estava vazio. "Mas nós  acabamos de falar com ele".
" Ele não esta não. O apartamento esta vazio. Se tivesse alguém teriam avisado aqui na portaria que vocês estavam chegando."
Foi um misto de aflição, risos nervosos e impaciência. Foi preciso continuar insistindo para que tentasse contato com o apartamento. Finalmente ele ligou, momentos de tensão. O porteiro havia conseguido instaurar a duvida em mim, e agora eu já pensava em onde iria dormir caso fossemos jogados na rua.
"Ninguém atende." Ele disse triunfante.
" Moço, tenta de novo." Enquanto isso Marion tentava sem sucesso falar com Caio pelo celular.
O porteiro tentou mais duas vezes. A essa altura já estávamos lá dentro, no saguão do prédio. Havíamos criado um vinculo do infortúnio com o porteiro. Nós, sem tetos em potencial em buscas de abrigo e ele, com um turno todo pela frente e cinco pessoas insistentes, ali no seu saguão, as quais ele havia cometido o erro de deixar entrar, e já vislumbrava a dificuldade de tira-las dali. Eu vi tudo isso na cara dele, e tive que rir, coitado do homem. So queria passar a noite tranqüilamente ali na guarita assistindo sua tevezinha. Ele era o retrato do arrependimento. Principalmente quando apareceu um morador, estilo o intrometido da vizinhança. E teve inicio toda uma explicação sobre o por que do burburinho.
Quinze minutos se passaram quando finalmente o telefone tocou, o porteiro atendeu. E eis que ninguém mais, ninguém menos do que Caio ao telefone, tranqüilíssimo, recém saído do banho.
O porteiro sorriu sem graça, Marion sorriu feliz, o restante de nós sorrimos aliviados.
A casa da vó era exatamente uma casa de vó. Um apartamento cheio de coisas lindas e antigas. Banho que te e cama macia.
No dia seguinte conhecemos a pérola desta viagem, Geraldina, uma pessoa linda, e muito carinhosa, que trabalha com a vó( todos já nos consideramos seus netos, ainda que ela não nos conheça) há muitos anos.
Foi com lagrimas nos olhos que no dia seguinte me deparei com a mesa de café da manha que Geraldina preparou Pra nós, mas fiquei um pouco constrangida por não te-lá ali na mesa comendo conosco. Mesmo com toda nossa insistência ela não quis sentar para tomar café.
Depois do café fui ate o Teatro Castro Alves para fazer a inscrição em um curso de desenho de figurino. A idéia era que assim que eu voltasse pegaríamos o caminho da roça.
Retornei ao apartamento e assim que passei pela porta sabia que não seria assim tão rápido. Vários aromas inundavam a sala, e a mesa ja estava posta. Geraldina preparava o almoço, e nenhuma das quatro criaturas que ficou no apartamento avisou a ela que já estávamos de partida. Segundo eles seria quase uma falta de respeito, uma desfeita.
Almoçamos felizes e tranqüilos, na verdade ninguém queria ir embora. Mas todos de alguma forma tinha, seus compromissos. Eu, no caso, só queria estar em Itacaré até as 21:00 para trabalhar. Mas a vontade era bem outra. A total liberdade que todos temos,o compromisso com nossas escolhas e a consequência de nossas vontades. É disso que se trata.
A volta era simples. Ônibus até o Ferry Boat, de Ferry Boat até Bom Despacho, e lá um ônibus direto para Itacaré. O ultimo saindo as 16:00.
É curiosa a estupidez do ser humano, que passa pelas mesmas dificuldades, inúmeras vezes, pelos mesmo motivos e ainda assim continua fazendo tudo igual.
Faltando cinco minutos para o horário de saída, chegamos a estação. Chegamos em tempo, quem atrasou foi o Ferry Boat. E atrasou muito.
Com o trajeto todo cronometrado para chegar a tempo de pegar o ultimo ônibus em outra cidade, o plano não admitia atrasos. Durante a espera compartilhamos historias e algumas vontades, entre elas a minha vontade conhecer Camamu, que só tinha ouvido falar o nome. Quando saímos de Salvador já passava das 15hs00, e chegamos a Bom Despacho quase 17h00
É claro, obvio, que o ônibus saiu pontualmente as 16h00, sem nenhum passageiro, pois estavam todos atrasados, junto com o Ferry. Nova rota, um breve interrogatório no guiche de passagens, e descobri que havia um lugar, ha quarenta minutos de Itacaré, pra onde coincidentemente estava saindo um ônibus naquele exato momento. O lugar era Camamu.
A essa hora já havia enviado uma mensagem ao chefe, avisando que ia me atrasar. Como alguém que entra as nove da noite, e mora na mesma rua do trabalho, consegue se atrasar, ele deve ter pensado. Mal sabe ele, e se soubesse, não acreditaria.
Até Camamu seria, aproximadamente, quatro horas de viagem. Chegamos lá e a cidade estava vazia, tudo fechado, inclusive a minúscula rodoviária.
Depois de conversar com os únicos dois moradores a desobedecer o toque de recolher, constatamos que não havia mais transporte para casa.
De repente um potente sistema de som sobre rodas vira a esquina. O som do Axé, vibrando até na minha medula, ecoava dali até Manaus. Pensei que passaria direto, mas parou, desligou o som e se ofereceu Pra nos levar por um preço razoável, caso precisássemos. E eu que estava com uma reclamação pronta por aquele som terrível, só consegui sorrir e agradecer pelos acezeiros de plantão. Sempre tão dispostos e com tanta energia. Proteja Senhor, todos eles.
Foi só o tempo dele ir guardar suas caixas faraônicas para que pudéssemos entrar no carro,  e estávamos no caminho.
O dono do carro foi nos contando sua história, um faroeste caboclo, sobre o seu irmão, que tinha sido assassinado há umas semanas, e como havia se aproximado do assassino, sem que este soubesse quem ele era, e como pretendia conseguir sua vingança ganhando a confiança do cara. Uma história surreal, com muita arma, violência, tristeza e vingança. Me impressionou muito. E se não foi verdadeira, admiro a mente que a produziu.
Cheguei na porta de casa, na Pituba, exatamente as 22:20. Foi o tempo de tirar a mala do carro, entrar em casa e ir pro trabalho.
Cheguei na cidade atrasada, cansada, mas a tempo de descobrir que aquecera o primeiro de quatro dias da festa de São Pedro. Fui obrigada a ir Pra lá né, assim que o bar fechou, a uma da manhã.

segunda-feira, 8 de julho de 2013


No vai da valsa

Esta meio abandonado isso aqui, mas é que muitas coisas tem acontecido, e são muitas coisas para contar, e entre contar e viver, tenho escolhido viver.
 O registro tem ficado aqui comigo, gravado na mente, nos olhos embasbacados e no coração. 
As coisas na Bahia simplesmente acontecem. É preciso ter um certo cuidado com o que se deseja aqui, por que acontece. Nos últimos tempos minha vida na Bahia foi um desdobramento de sucessivos encontros que me levaram a desencontros que me levaram a encontrar coisas que nem estava procurando. Vida é realmente uma coisa muito louca, da qual ninguém pode escapar, como minha grande amiga Camila me lembrou essa semana. Quanto antes entendemos isso maior a nossa oportunidade de não perder nenhum segundo dos acontecimentos que nos cercam. O lance é que a felicidade é um flash, é um momento com vários picos, que só alcança quem esta entregue ao momento.
 As ultimas semanas foram mais ou menos assim:
Conheci uma pessoa especial, uma cineasta francesa, louca e engraçada, chamada Marion, com quem cruzei varias vezes pelo Hostel, que é quase uma comunidade, uma família na verdade, o Buddy's, casa da Laissa, Pedro, Caue e Guinter. Como todas as outras pessoas que conheço em Itacaré, cada um deles tem uma história muito curiosa que os trouxeram ate aqui, mas isso é conversa Pra um outro dia.
Como disse, cruzava com Marion sempre, e nunca trocava mais do que um oi ou um bom dia. Com alguns amigos em comum foi através dela que soube do Festival de cinema baiano, FECIBA, e de repente estava combinado que iríamos juntas para três dias em Ilhéus, para o festival.
 No festival de cinema, muitos filmes e muita gente interessante. A galera da organização do festival foi ótima. Entre as pessoas que conheci estava o Leon, cineasta do recôncavo baiano, que entre conversas nos falou sobre a festa de São João em Cachoeira, terra do samba de roda, com muitos shows durante as festividades, inclusive Alceu Valença, Gilberto Gil e o incrível Samba de Roda da Dona Dalva. E foi através do Leon, que uma semana depois estávamos na casa do seu amigo Breno, musico e cineasta em Cachoeira. Um cara muito gente boa, com um coração enorme. Dos quatro dias que ficamos na casa dele vimos várias configurações diferentes no apartamento, sempre cheio de gente, conversa e principalmente música, ininterruptamente. A coisa foi tão louca que um dia cheguei de um show, e lá da rua vi Andréia, uma artista de Salvador, pendurada na janela. Quando entrei no apartamento estava rolando um ensaio fotográfico, as três da manhã, que começou de brincadeira, mas a fotografa( que ate então nunca tinha visto antes) realmente se empolgou, enquanto as outras pessoas faziam um som do outro lado da sala. Cada dia, ou cada noite, alguém partia e alguém chegava, ou pelo menos passava. Foi uma delicia. Muitos encontros criativos naquele lugar, na música, na dança, na fotografia, na comida.  E foi assim, minha passagem por cachoeira. Pra saciar qualquer sede.
Agora, a volta de cachoeira para Itacaré, foi uma odisséia.
Quinta-feira, 30 de Junho, 17:00. Cinco pessoas sentadas na Rodoviária, minúscula, de Cachoeira. O ultimo onibus Pra Itacaré sai da cidade antes das 12:00. Isso nos ja sabíamos, so não sabíamos que não havia mais nenhum onibus na Rodoviária aquele horário seguindo sentido Sul, ou seja, não havia onibus para sair da cidade. E não tínhamos mais onde ficar, pois o Breno e o Pedro, que estavam nos hospedando, viajaram naquele mesmo dia.
Depois de um extenso e exaustivo  interrogatório com a menina do guiche descobri que estávamos na rua e na chuva. A gente se olhava e ria. E foi ai que descobrimos que havia um onibus Pra sair, um onibus pra Salvador, sentido oposto do nosso destino. Rapidamente a produção tomou as devidas providencias. Marion acionou seus contatos e conseguiu, com seu futuro namorado, Caio, , acomodação para cinco mendigos, no apartamento da avó do rapaz, que estava viajando. Todos de acordo, as passagens foram compradas. E lá fomos nós Pra Salvador. As duas horas que separam Cachoeira de Salvador não poderiam ter sido mais...intensas.
O bagageiro não tinha mais espaço, por que uma familia estava com uma barraca enorme de feira Pra ser transportada, nao so a barraca, mas todo o material a ser vendido. Ja dentro do onibus varias pessoas que viajariam de pé me deixaram feliz com meu assento ao lado do banheiro. No banco atras de mim cinco pessoas dividiam dois assentos, e uma senhora transitava alegremente da poltrona da janela para o corredor, onde seguia empurrando as pessoas que estavam em pé, brigando com alguém chamado Rodrigo, que estava sentado lá na frente. Fazendo questão de sempre puxar o meu cabelo quando levantava do banco.
 Aquele era o tipo de ônibus onde o número da poltrona indicado na passagem não tem valor algum. Na minha frente houve um leve desentendimento quando uma mulher fez valer o seu direito e expulsou um homem do seu lugar. Esta mesma mulher sentou, abriu sua super bolsa e enquanto o ônibus seguia começou um ritual que eu não estava entendendo muito bem, começou a pentear o cabelo de um jeito esquisito, meio na horizontal, e de repente eu percebi que ela estava fazendo uma touca. Talvez estivesse adiantando as coisas, pra chegar em casa e dormir. Pra quem não sabe, touca é uma técnica dazantiga  para preservar a escova. Consiste em pentear o cabelo, prende-lo na horizontal, em volta da cabeça, e prende-lo com grampos. Confesso, fiquei de cara, mas quando ela sacou a touca e colocou na cabeça...não qualquer touca, uma original touca feita de meia calça, e colocou na cabeça, admirei aquela mulher. Só não soube se tinha presenciado um excesso de vaidade ou seu total desapego. 
Enfim, a viagem seguia, as luzes apagadas, eu dormi de um lado e a Marion de outro. Caue, Guinter e Rodrigo estavam espalhados pelo ônibus. Tudo ok, até eu acordar com uma gritaria. Alguma coisa acontecia na parte da frente, eu não conseguia ver nada. Vários passageiros estavam aglomerados e xingando alguém. Muitas vozes de mulheres bravas. A Senhora atras de mim estava frenética, quicando no corredor. Um alvoroço. Um pouco depois, quando toda a indignação e raiva estavam virando piada, entendemos  que um homem estava discutindo com a mulher, a briga ficou feia, tinha uma mala envolvida na discussão, ele levantou, puxou a mala, ela não deu (serio, as notícias chegaram assim) puxou de volta, ele bateu nela, alvoroço, as mulheres gritam, querem pegar o cara, muitas ofensas, eles sentam, tudo parece se acalmar. Não, espera...ele deu um tapa nela, novo alvoroço, um gringo pega o cara pela garganta e senta ele de volta no lugar, todo mundo grita, todo mundo ri. A senhora do assento de trás esta em êxtase, corre no corredor Pra lá e Pra cá, gritando que "tem que jogar ele Pra fora do ônibus". Eu só conseguia rir, aquilo era muito surreal. Lembro da Marion dizendo que nunca veria aquilo na França, feliz da vida por estar no Brasil.
No fim das contas, o motorista parou,  segundo o Caue e Rodrigo que estavam bem no banco de trás, em cima dos fatos, o cara levou vário tapas e bofetões das mulheres que estavam por perto, levou um pescoção do motorista e foi jogado Pra fora do ônibus. Na chuva. Em outra cidade. Sem a mala e sem a mulher. Os comentários seguiram animados até Salvador, sem pudores pelo fato de a mulher ainda estar no ônibus.
Continua...
Nossa, muita coisa. To saindo agora, Pra viver mais um pouco, rs!